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Solidão e laço: por que às vezes nos sentimos sós mesmo acompanhados?

  • Foto do escritor: Daniela V Del Frari
    Daniela V Del Frari
  • 1 de jul.
  • 2 min de leitura

Estar com alguém não garante que nos sintamos acompanhados. É possível viver em família, ter amigos, dividir a vida com um parceiro, e ainda assim experimentar uma profunda solidão. A psicanálise nos ajuda a pensar que a solidão não está apenas na ausência do outro, mas também — e principalmente — em como nos sentimos diante da presença dele.


Não se trata de contar com companhia, mas de se sentir em laço. E estar em laço é diferente de estar junto: é se sentir tocado, escutado, considerado como sujeito. Quando isso não acontece, mesmo relações próximas podem parecer distantes. Às vezes, é no meio da conversa, de um abraço, ou mesmo numa vida inteira a dois, que alguém percebe: estou só.


A solidão que vem da falta de escuta


Para a psicanálise, o sujeito se constitui na relação com o outro. É a partir da escuta, da troca e da diferença que construímos nossa subjetividade. Mas quando a escuta não existe — ou quando somos obrigados a nos moldar para sermos aceitos — o laço se torna frágil.


Muitas pessoas aprendem, desde cedo, que precisam agradar, esconder o que sentem, evitar conflitos. Criam vínculos baseados no desempenho, na adaptação, e não no encontro verdadeiro. Nessas relações, o sujeito não se sente visto. Está ali, mas não é reconhecido. E isso pode gerar uma solidão ainda mais dolorosa: aquela que se vive mesmo em meio à presença do outro.


A ilusão de que estar com alguém resolve o vazio


Há também a fantasia de que o amor, a amizade ou a convivência são soluções para o mal-estar. Como se o laço garantisse completude. Mas o sujeito, em sua essência, é marcado por uma falta — falta essa que não será preenchida por ninguém.


Lacan nos lembra que o outro não tem aquilo que nos falta. E quando esperamos isso de alguém, transformamos a relação numa promessa impossível. Ao não ser correspondido nesse ideal, o sujeito se decepciona e volta a se sentir só. Não por culpa do outro, mas porque nenhuma presença humana é capaz de eliminar a solidão estrutural de ser quem se é.


Quando o laço é possível


Apesar disso, há formas de estar com o outro que não negam essa falta, mas a sustentam. Relações em que se pode falar, escutar, silenciar, errar. Em que o sujeito pode existir sem precisar se esconder, se apagar ou se adaptar o tempo todo. O laço verdadeiro não elimina a solidão, mas faz com que ela se torne mais suportável — talvez até mais compartilhada.


A análise, nesse sentido, também é um laço. Um tipo diferente de relação, onde não é preciso performar. Onde o sujeito é convidado a falar de si, sem ser julgado, sem precisar agradar. E, ao fazer isso, muitas vezes ele descobre que a solidão que tanto pesava já estava um pouco menos densa — porque, enfim, alguém escutou.


Conclusão


Estar acompanhado não é o mesmo que estar em laço. A solidão, mesmo quando negada, continua se fazendo presente sempre que o sujeito não pode existir de forma inteira nas suas relações.


O que a psicanálise propõe não é eliminar a solidão — mas criar espaços onde ela possa ser dita, escutada, elaborada. E, nesse processo, abrir caminhos para laços mais verdadeiros, menos exigentes, mais humanos.

 
 
 

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