Quando o pedido de desculpas não vem: o silêncio do outro e o que ele nos causa
- Daniela V Del Frari

- 14 de jul.
- 2 min de leitura
Às vezes, passamos anos dizendo que está tudo bem. Que já superamos, que não foi tão grave, que entendemos os motivos do outro. Mas, em algum momento, algo nos atravessa: a consciência de que aquilo doeu mais do que imaginávamos. E que sim, alguém deveria ter pedido desculpas.
Na vida psíquica, o que não é dito, negado ou desmentido não deixa de existir — pelo contrário, costuma retornar. Quando alguém nos machuca e não reconhece, o sofrimento fica suspenso, como uma ferida sem nome, que segue aberta sem possibilidade de cicatrizar. A ausência do pedido de desculpas pode nos deixar confusos, nos fazer duvidar da gravidade do que vivemos. E a análise mostra que essa dúvida tem um preço.
Quando o outro nega, eu me calo
É comum que, diante da recusa do outro em se responsabilizar, o sujeito silencie sua dor. Isso pode ser uma tentativa de seguir em frente, de preservar a relação, ou mesmo de evitar o conflito. Mas muitas vezes também é uma forma de defesa psíquica: se o outro — alguém importante — não reconhece o que fez, talvez seja melhor fingir que nada aconteceu.
Esse movimento, no entanto, pode trazer efeitos. A dor que não encontra reconhecimento tende a se transformar em sintoma, em dificuldade de confiar, em sentimentos de inadequação ou em raiva reprimida. Quando o pedido de desculpas não vem, o sujeito muitas vezes se culpa por ter se sentido ferido — como se o problema estivesse nele por “ter sentido demais”.
Reconhecimento não é só formalidade
Pedir desculpas não apaga o que foi feito, mas pode abrir espaço para que o sofrimento se torne falável. O reconhecimento da dor pelo outro tem um valor simbólico: ele confirma que aquilo aconteceu, que foi importante, que você não está inventando. É nesse reconhecimento que o sujeito começa a sair do lugar de quem se culpa e entra no lugar de quem se responsabiliza por si.
Por isso, quando o pedido de desculpas não vem, o trabalho analítico muitas vezes é o de dar nome ao que não foi nomeado. É poder dizer: aquilo me feriu. Mesmo que o outro não reconheça. Mesmo que o pedido nunca chegue.
E quando nunca vem?
Há casos em que o pedido não virá. Porque o outro não quer, não pode, ou nem está mais presente. E é nesse ponto que a psicanálise pode ser uma aliada: não para fazer o outro mudar, mas para que o sujeito encontre uma saída que não dependa do outro.
Não se trata de perdoar a qualquer custo, nem de seguir em frente sem elaborar. Mas de poder olhar para a própria dor, dar-lhe um lugar, e pouco a pouco retirar dela o peso de uma espera infinita. Às vezes, é no espaço da análise que o sujeito pode dizer, enfim, o que queria ter ouvido.
Conclusão
A falta de um pedido de desculpas não significa que a dor foi pequena — significa, muitas vezes, que ela foi invisibilizada. E essa invisibilidade dói. Mas há caminhos para lidar com isso que não passam por esperar do outro o que ele talvez nunca vá oferecer.
Reconhecer o que nos feriu, mesmo sem o aval do outro, é um passo importante para deixar de viver como se a dor fosse culpa nossa.



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